2007-11-25

Galileo vs Futebol

O projecto Galileo, o GPS europeu, foi aprovado na presidência portuguesa. Graças à negociação habilidosa dos 'Tugas', e com um pouco de sorte, Portugal conseguiu desbloquear um projecto que estava parado há uma data de anos.

O projecto Galileo vai revolucionar a maneira como gerimos o espaço aéreo europeu, melhorar a segurança no ar e no mar, fazer o seguimento das embarcações, permitindo um melhor combate à poluição, gerir com eficiência os transportes terrestres, aumentar a segurança interna e a independência tecnológica da Europa em relação ao sistema GPS americano ou sistema GLONASS russo. Tudo isto graças a 30 satélites que permitem um serviço de geo-referenciação avançado.


O projecto, para poder ser concluído, precisava de 3.5 mil milhões de euros. Arranjámos mil milhões de euros pelas vias normais. Depois fomos buscar 1.6 mil milhões à redução de subsídios atribuídos à agricultura comunitária europeia para este ano devido à escalada dos preços de produtos alimentares pelo aumento da procura por países asiáticos.

Depois, mais 200 milhões de reafectação (flexibilização) de programas-quadro comunitário da mesma área tecnológica, 400 milhões do programa-quadro de investigação (EuroAtom, etc) e 300 milhões do Instituto Europeu da Tecnologia. Conseguimos fazer o que todas as outras presidências, desde 1999, falharam. Porra, somos bons ou não somos? Somos os maiores.


E por cá em Portugal, alguém veio a saber disto pela comunicação social, a TV, rádio, internet, blogs (sem ser aqui)? Não, o que importa era o futebol, o caso Maddie, o futebol, o caso Esmeralda, mais o futebol, o caso Casa Pia, e ainda o futebol. Falar de um marco alcançado na Presidência Europeia, ainda por cima a Portuguesa? Para quê?

A notícia teve destaque no horário "prime-time". Nas televisões estrangeiras. Por cá, os interesses editoriais são outros. Meia-hora de política nacional mais meia-hora de desporto - futebol claro está. Em todos os canais nacionais.

Da análise que faço dos media - e são um óptimo barómetro para auferir a qualidade da nossa democracia - o que nos falta em representatividade, conseguimos compensar com participação pública de várias associações emanadas da sociedade. Mas falta-nos aquele "extra", o conseguir ir mais além.

É o tornarmo-nos numa "sociedade inteligente", com "reservas" de "conhecimento puro", capaz de difundir entre nós aquilo que é a "democracia cognitiva" e a única forma de democracia que traz qualidade e participação da sociedade civil na definição das políticas públicas, com uma capacidade de analisar e decidir o que é melhor para Portugal num horizonte alargado.

Ou seja, um país com uma sociedade desenvolvida, que discute política a sério, e não quem fica com aquele ou outro cargo. Que exige acima de tudo qualidade no desempenho do trabalho e que deixe de olhar para o salário mínimo mais baixo na EU15 como um vantagem competitiva. E que toma atenção a projectos que têm um impacto económico ou com significado político importante a nível europeu.

No fundo, acho que somos um povo ressabiado consigo próprio, com falta de visão e desconexado da realidade fora de Portugal. Um povo que gosta de culpar e que com isso pensa que consegue alguma coisa. Que se "vicia" nos escândalos, tragédias, "circos" do Parlamento e espectáculos de futebol. Depois, não se admirem de termos o país e os políticos que merecemos.