2007-04-23

O Surreal na Política Portuguesa

O que se está a passar na política portuguesa é deveras surreal. Lembra-me um filme de "Bernardo Bertolluci" - 1970, nada "holywoodesco"- a "Estratégia da Aranha", onde o cidadão anónimo se confronta com a mentira sexy, os símbolos e ideais falsos de um regime político. Nele, o realizador alerta para a necessidade de uma personalidade forte para manter a sua capacidade analítica e espírito crítico, sem se deixar controlar pelo ambiente surrealista criado e controlado pelo regime político.

Vêm-me à memória, não sei, vá-se lá saber, se calhar alguém me contou, as conversas do primeiro-ministro com jornalistas na linha da frente, os milhares de emails enviados pelo centro de comunicações socialista, as pressões criadas a directores de informação, a propaganda, sempre a propaganda, o imiscuir do mais baixo nível na comunicação social sem guardar as respectivas distâncias.

Basicamente, temos um governo - básico - que chegou ao poder com promessas impossíveis de cumprir, mas que agradou à maioria do eleitorado português. Criou-se um clima novo na política portuguesa, onde o estado de graça parece estender-se infinitamente, reflexo das alterações climáticas não vá o céu cair-lhes em cima e que até já entraram na linha programática do CDS - cada vez mais - PP.

Numa altura em que Portugal se encontra num estado frágil, a precisar de cuidados intensivos, temos governantes que desejam aumentar a sua influência política nos órgãos de comunicação social. Isto porquê? Seremos assim tão influenciáveis pelo marketing político? Sim.

Portugal ainda não está suficientemente preparado para um novo regime de participação política. Sou um adepto da Democracia Directa. Não me importo, como na Confederação Helvética o fazem, de me informar e de decidir, votando 5, 10, 20 vezes por ano, matérias de assunto federal ou cantonal. Mas em Portugal, com a nossa falta de cultura - falta de interesse perhaps - e défice de cidadania, não resultava. Seria mais um instrumento à disposição de grupos de pressão. E isso aumentaria o nosso desgoverno. Uma mentira repetida vezes sem conta acaba por se tornar uma verdade pública.

Se tenho pena de ter um país assim? É claro, mas isso não me leva a baixar os braços. Num momento onde a esperança por algo melhor que um abismo sem-fundo que se tornou a anterior governação levou a um Estado que se arrisca a adquirir características ad perpetum, nunca os últimos 30 anos de democracia se conheceu um governo tão centralizador de poder como este. Para que serviu então o 25 de Abril?

Nota à parte:

A minha opinião técnica sobrepõe-se sempre à do partido. Sou a favor da Ota por ser a opção que menor impacte ambiental têm. Não teria dúvidas nenhumas que se se fizesse um referendo sobre o NAL, o projecto da Ota seria cancelado. Enganar a opinião pública é fácil, desde que se multipliquem e subam de tom as vozes da discórdia. Mas quando um cidadão se preocupa com o rigor da informação que lhe é prestada, aí as coisas passam a ser radicalmente diferentes.

Veio a público, no penúltimo número do Expresso, um artigo de resposta em que um comentador muito citado pelos que estão contra a Ota, explicava que disse mas não queria dizer que a Ota estava directamente relacionada com uma situação que levou a um trágico
acidente da Força Aérea Portuguesa na Serra dos Carvalhos, ao pé de Coimbra (!) E que afinal ele não era um académico do Instituto Superior Técnico, mas um professor convidado na faculdade de Arquitectura da UTL. E que, por fim, quem lhe tinha dito aquilo dos problemas do nevoeiro e ventos cruzados não tinha sido um piloto da FAP, mas uma espécie de "especialista aeronáutico prestigiado" mas sem o querer referir. Isto porque ou repunha a verdade ou ficava descredibilizado. Reconheceu o erro, embora acabe por tentar "suavizar a coisa" com um "talvez", omitindo as suas fontes.

Se aprofundarmos os argumentos apresentados por ele e outros auto-intitulados "especialistas aeronáuticos
prestigiados" e compararmos com o que se passa em outros aeroportos internacionais na Europa, acabamos por verificar que afinal não têm fundamento técnico. Para um leitor incauto, isso passava completamente ao lado. Os detalhes são uma coisa tremendamente chata. É que é preciso estar bem informado.

1 comentário:

Isabel Magalhães disse...

Caro DC;

Eu não desisto de ler estes posts.

(Da discussão nasce a luz!)




*** I.